Sobre rótulos e a arte de desqualificar as pessoas



Nunca ouvi alguém dizer que gosta de ser rotulado. Mas precisamos admitir: rótulos são úteis. Eles nos dão um pouco de previsibilidade acerca das pessoas e nos poupam de gastar energia tendo que decifrar cada uma de suas ações. "Ah, ela é meio doidinha mesmo", "Tu sabe que ele gosta de mentir, né?", ou "Esse cara é muito engraçado!". Imagina o tempo que você gastaria no mercado se os produtos não estivessem separados por seções! Ter que olhar produto por produto até encontrar o que você precisa. Os rótulos acabam nos ajudando a categorizar as pessoas. Quem vale a pena ouvir, com quem tomar cuidado.

Isso não significa que os rótulos sejam justos. Os critérios que a gente usa são os mais variados: como a pessoa se veste, onde mora, o que posta na internet, no que trabalha. Às vezes, são totalmente subjetivos: "Meu santo não bate com o dele". Às vezes, são merecidos: "Tem gente que pede pra ser zoada, né?" Outras vezes, são intencionalmente construídos. Quem contrata uma celebridade para anunciar um produto, o faz por querer tirar proveito do rótulo associado aquela pessoa. E as tais celebridades são cuidadosamente assessoradas para comportar-se de acordo com a imagem que querem vender. Claro que não só as celebridades. Afinal, para que servem as técnicas de marketing pessoal? Até quem diz que não liga pro que os outros pensam está querendo vender a imagem de que não liga pro que os outros pensam.

Ok, os rótulos podem até nos proteger e ser vantajosos pra nós. Mas um sinal de maturidade é, admitindo sua existência e utilidade, reconhecer que eles não são a verdade. Se eles são uma maneira de simplificar a nossa vida, ficar preso a eles nos rouba. O crescimento que poderíamos experimentar, as pessoas que poderíamos conhecer, as mudanças que poderíamos alcançar.

O debate político é hoje um exemplo disso. Há dois lados disputando. Ao invés de buscar a verdade, o objetivo é provar estar com a razão. Você pode dizer qualquer coisa que o faça parecer estar certo, não importa se é verdade ou não. Só não vale escutar o outro. É o "coxinha", o "esquerdopata", a "feminazi", a "elite branca". O outro está desqualificado pro debate e assim você não precisa se dar ao trabalho de considerar o que ele diz. Quem está qualificado? Quem tem os rótulos certos e, normalmente, pensa igual, que faz acreditar que se faz parte do clube dos bons, contra os maus do lado de fora.

É assim que você quer passar o resto da vida? Ouvindo ecos de seus próprios pensamentos? Acreditando que a solução problemas da sociedade cabe todinha dentro da sua cabeça e das dos seus amigos? Não é só o outro que está sendo desqualificado, você também está. Sendo rotulado. Você já deve ter ouvido que o produto hoje somos nós. Redes sociais, sites de busca traçam nossos perfis e os vendem a quem quer nos vender coisas. E, sabendo o que gostamos de ver, o que procuramos, oferecem-nos sempre os mesmos assuntos.

Como escapar disso? Eu realmente não sabia onde ia terminar quando comecei o texto. Mas não consigo pensar em outra saída que não Ele. Jesus. Ele disse: "Eu sou a verdade" (João 14:6). É muito bom encontrar alguém que sabe quem é. Porque, sinceramente, estamos perdidos acerca de nós mesmos. Ficamos confusos no meio dos rótulos que criamos e dos que criaram a nosso respeito. E, para o nosso alívio, Ele sabe, além da verdade sobre Si mesmo, a verdade sobre nós. "Porque o Senhor não vê como vê o homem, pois o homem vê o que está diante dos olhos, porém o Senhor olha para o coração" (1Samuel 16:7). E claro, se nós somos mais do que o que está diante dos olhos, podemos concluir o mesmo sobre os outros. Eles são mais do que seus rótulos.

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